Legalização
Por um debate que seja, de fato, profundo
Marcha da Maconha, realizada neste sábado em Pelotas, pretende tornar mais ampla a discussão sobre uso e cultivo da Cannabis
Moizés Vasconcellos -
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou neste mês medida em que torna medicinal a Cannabis sativa. A decisão reconhece o poder da planta em controlar convulsões derivadas de epilepsia de difícil controle, por exemplo, mas não altera, ainda, a política ostensiva de proibição e criminalização em relação ao cultivo e ao uso da maconha no Brasil. Neste sábado, a partir das 14h, em Pelotas, uma marcha ocorre com o objetivo de reforçar a luta por uma leitura mais profunda sobre o tema.
Na edição 2017, o evento será pautado a partir do viés da segurança pública. Em entrevista ao Diário Popular, os organizadores contestam a “guerra às drogas”, como é chamada atualmente a política de combate ao uso e ao cultivo da cannabis, com a criminalização utilizada como ferramenta. “Já nos causou muito estrago. Todos os dias vemos nas ruas diversos atos de violência vinculados ao consumo e à venda de entorpecentes”, comentam Jocemar Maciel e Mariane Simões. No Brasil, de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), um em cada quatro presos foi condenado por roubo ou tráfico de drogas - por vezes, ambos se cruzam. “Nossa discussão não se baseia apenas no consumo, queremos um debate sério e aberto para que possamos procurar soluções para reverter esse quadro”, pontuam.
Do outro lado da corda, o argumento mais em voga nos dias atuais compara a liberação da maconha com o livre uso do álcool e do cigarro. Para o médico Antonio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), naufragariam todos os anos de campanha para a diminuição no consumo de bebidas alcoólicas e tabaco. “A droga, quando fumada, piora todos os quadros psiquiátricos, que já atingem até 25% da população, como depressão, ansiedade e bipolaridade. A maconha pode desencadear as primeiras crises graves”, afirma em manifesto assinado pelo órgão que coordena.
Estudo
Dentro da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), em parceria formada com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça (Senad), a Junta Nacional de Drogas (JND) e a Universidade da República Oriental do Uruguai (Udelar), um projeto de pesquisa tem sido realizado com o objetivo de monitorar o efeito da nova política de regulação do mercado de cannabis no país vizinho sobre a zona de fronteira, contribuindo assim para a seriedade da discussão. O estudo, que tem duração de quatro anos, é estruturado em dois eixos: o primeiro, sob responsabilidade do Ipea, aborda as áreas de economia e segurança pública. O segundo, comandado pela UFPel, concentra-se na saúde pública e práticas de consumo de drogas.
O Ipea conduziu durante 2016 dois levantamentos: uma pesquisa domiciliar quantitativa em municípios catarinenses e gaúchos, e uma qualitativa com representantes dos sistemas de Justiça e Segurança Pública. Dentro desta, percebeu-se a ausência de adesão das autoridades de segurança e do sistema criminal à política sobre drogas. No Brasil, de acordo com o estudo, a abordagem é ainda majoritariamente proibicionista, existindo dissensos relevantes na magistratura e na Defensoria Pública, órgão “preponderantemente antiproibicionista”. Está presente no levantamento, da mesma forma que, segundo as autoridades uruguaias e brasileiras, a regulamentação não resultou em grandes alterações nem na dinâmica do consumo da cannabis nem nas condições de segurança na zona de fronteira.
O segundo eixo, que diz respeito ao consumo das mais variadas drogas, entrevistou 97 usuários e percebeu o início do uso geralmente entre 7 e 14 anos pela utilização do álcool, sendo o contato com a cannabis se dando de dois a cinco anos depois - o que, de certa forma, desfaz o estigma de que é a maconha a porta de entrada para entorpecentes mais pesados.
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